Há mais de 30 anos, Samba da Praça do Tropeiro fortalece a cultura em Feira de Santana

Nesta terça-feira, 2 de dezembro, é comemorado o Dia Nacional do Samba. O gênero musical genuinamente brasileiro surgiu em meados do século XIX, tem raízes africanas e fortes ligações com a Bahia. Em Feira de Santana, há mais de 30 anos essa cultura popular é perpetuada toda segunda-feira na Praça do Tropeiro.

,Origem e legado feirense

O tradicional samba começou a ser realizado nos anos 1990 em um galpão do Centro de Abastecimento da Princesa do Sertão, em um local conhecido como ‘Pau da Miséria’. O sanfoneiro Bié dos 8 Baixos foi um dos pioneiros da manifestação cultural feirense. O músico faleceu em 2021 em decorrência de um Acidente Vascular Cerebral (AVC).

Bié dos 8 Baixos | Foto: Rachel Pinto/ Acorda Cidade

Bispo do Cavaquinho deu continuidade à tradição sertaneja e tornou-se outra figura importante do Samba que passou a ser realizado na Praça do Tropeiro, também localizada no Centro de Abastecimento. O sambista faleceu 8 de julho de 2025.

Bispo do Cavaquinho | Foto: Acervo pessoal

Dois dos atuais organizadores, Marcia Marcinha Sambadeira e o sanfoneiro Luizinho dos 8 Baixos, herdaram o legado deixado por Bié e Bispo. Com responsabilidade, resistência, superação e amor pelo Samba de Roda o atual grupo musical transforma toda tarde de segunda-feira em festa na cidade.

É da Bahia

O ritmo dançado e cantado hoje em dia na Praça do Tropeiro é antigo e baiano. O primeiro de todos os sambas, o samba de roda, surgiu entre os negros escravizados no Recôncavo da Bahia no século XIX, fruto da mistura de ritmos africanos. Por muito tempo o gênero musical foi marginalizado e já chegou a ser considerado crime baseado na Lei da Vadiagem de 1890.

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A baiana Hilária Batista de Almeida, conhecida como Tia Ciata, foi uma das personalidades fundamentais para o crescimento e consolidação do Samba como conhecemos hoje. Em 1854 ela se mudou para Rio de Janeiro, a então capital federal, onde com o passar dos anos o Samba se transformou em um símbolo nacional do Brasil.

Tia Ciata | Foto: Reprodução

A repressão e o preconceito contra o Samba só começaram a enfraquecer a partir da década de 1930, quando o governo Getúlio Vargas passou reforçar o gênero como uma expressão cultural legítima do povo brasileiro.

Em 2004 o samba de roda foi reconhecido como patrimônio imaterial brasileiro e da humanidade pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Em 2005 recebeu o título de Patrimônio Imaterial da Humanidade da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Samba de sanfona

A sonoridade tradicional do samba de roda se forma com as palmas do público, instrumentos de percussão como o pandeiro, atabaque, reco-reco e agogô, além de instrumentos de corda como viola e o cavaquinho. Lá na Praça do Tropeiro ele ganha toques diferenciados que fortalecem a identidade local, onde são adicionados sanfona, triângulo, zabumba e timbal, formando o samba de sanfona.

Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

Energia que atrai o público

Em entrevista ao Acorda Cidade, Marcia Marcinha contou que herdou da mãe a paixão pelo samba de roda. “É uma energia tão boa que tu nem imagina. Eu posso ter a melhor roupa para vestir, mas para mim o melhor dia é o dia de hoje”, declarou a sambadeira, que se tornou uma personalidade admirada e conhecida do evento.

Márcia Marcinha Sambadeira | Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

Segundo ela, o Samba da Praça do Tropeiro atrai visitantes que vão de comerciantes e consumidores do Centro de Abastecimento a até turistas de outros estados do Brasil. “Vem de São Paulo, do Rio de Janeiro. Vem gente de tudo quanto é canto. Da redondeza toda, cidades da região, muitos lugares”, enfatizou Marcinha.

Luizinho dos 8 Baixos, o sanfoneiro do conjunto musical, ressalta a importância da manifestação cultural sertaneja, que também é local de se ganhar visibilidade. “A gente faz amizade, a gente faz o que a gente gosta. Já virou tradição, tanto para nós que somos músicos quanto para o pessoal que vem sempre acompanhar”.

Luizinho dos 8 Baixos | Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

A moradora do bairro Rua Nova, Andrea Silva, contou que frequenta o Samba há três anos e não perde um dia da festa popular. “Isso aqui é maravilhoso. Se não tiver toda segunda-feira, não é o Centro de Abastecimento, a Praça do Tropeiro”, declarou em entrevista ao Acorda Cidade.

Andrea Silva | Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

Antônio Ramos, conhecido como Tonho da Égua, mora em Salvador e vem para Feira de Santana todas as segundas-feiras para participar do Samba da Praça do Tropeiro. “Eu participo há 15 anos. Aqui eu toco triângulo, pandeiro e canto muito”.

Antônio Ramos | Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

Reforma na praça

Foto: Paulo José/Acorda Cidade

Desde julho de 2025, a Praça do Tropeiro está passando por uma obra de requalificação, com previsão de seis meses para conclusão da obra. Apesar da reforma e mesmo em um espaço apertado, os integrantes do Samba decidiram permanecer no local.

Praça do Tropeiro – Foto: Apolo Rocha

“Aqui está gostoso. Mas tem que ter melhora, está muito calor, tem que ter espaço”, afirmou Jusselma de Souza, uma das frequentadoras do evento.

Jusselma de Souza | Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

“Mesmo com o calor, mesmo com todo o sufoco que a gente está, mas é aqui que a gente vai ficar”, contou Marcinha.

Falta de incentivo financeiro

Sem patrocínios financeiros oficiais, o Samba da Praça do Tropeiro se sustenta do amor e dedicação dos seus frequentadores. Eventualmente a manifestação cultural recebe colaborações simbólicas de visitantes e barraqueiros da região.

As quantias arrecadas acabam servindo apenas para o custeio do deslocamento dos integrantes. “Tenho certeza que os políticos daqui de Feira de Santana já viram isso, que a Praça do Tropeiro nunca foi divulgada como hoje, com o nosso samba. Na verdade, a gente faz porque a gente gosta. Mas é na força e na vontade, porque se fosse depender do dinheiro não teria como a gente fazer”, contou Luizinho dos 8 Baixos.

Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

O sucesso do grupo musical formado na Praça do Tropeiro já levou os músicos e sambistas a se apresentarem em eventos fora de Feira de Santana. Eles já se apresentaram em cidades como Cachoeira, Santo Amaro e até no estado de Sergipe, além de festas familiares. “Eles pagam, mas quando divide o dinheiro, fica pouco, não dá nem para a gente comprar um instrumento”, detalhou Luizinho.

A força do samba

Ao longo dos anos, o samba das segundas-feiras se tornou um ambiente não só de dança, poesia e música, mas um local de encontro de gerações, formação de amizades e até de casais. Foi na Praça do Tropeiro que dona Lúcia Carvalho conheceu o companheiro, seu Manuel Antônio, um dos instrumentistas do grupo.

Lúcia Carvalho e Manuel Antônio | Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

“Ele começou a me chamar de pombinha e eu sambando. Ele falou: eu vou pegar aquela pombinha e botar na minha gaiola. E botou mesmo”, contou Lúcia Carvalho em entrevista ao Acorda Cidade.

Dona Marta Almeida, comerciante na Praça do Tropeiro há 30 anos, é uma testemunha do crescimento e incentivadora do Samba ao longo dos anos. Para ela, as segundas-feiras são dias de diversão e maior lucro.

Marta Almeida | Foto: Jefferson Araújo/ Acorda Cidade

“É uma cultura muito boa, uma festa muito antiga. Gosto muito do Samba”, revelou dona Marta.

Veja o vídeo:

Acorda Cidade

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